quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Ana Luísa Amaral e a Tradição

O livro de poesia de Ana Luísa Amaral, A Génese do Amor, inscreve-se na linha temática do nosso curso de Tendências Actuais na Literatura Portuguesa, que é o diálogo com o passado, com a tradição. Todavia, este dialogismo parece ser muito intenso em toda a poesia de Ana Luísa Amaral. Assim o descreve Maria Irene Ramalho de Sousa Santos no seu "Prefácio" à Minha Senhora de Quê de Ana Luísa Amaral:
«(…) Ana Luísa Amaral escreve os seus poemas em diálogo constante com os poetas, com a poesia e com a tradição — ou, mais bem dito, com as tradições. (...) A reinvenção da tradição a que o talento e a imaginação de Ana Luísa Amaral vêm dando forma desde há dez anos constitui, ela própria, uma tradição reinventada: a tradição ininterruptamente reimaginada por mulheres poetas, a cuja inteligência não pode deixar de incomodar o modelo órfico que largamente preside à lírica ocidental até hoje (...).»
A própria Ana Luísa Amaral, perguntada sobre pontes constantes da sua poesia com textos do passado, respondeu:
«[Poesia] É as quatro coisas: solilóquio e diálogo, novidade e reactualização do já dito. O poema existe sempre a sós consigo, tal como quem o escreve está sozinho perante si mesmo; ao mesmo tempo, ele existe também em relação (com os outros, leitores, ainda que ideais, e com a tradição). Adicionalmente, e porque existe em relação, a poesia aspira a um trabalho novo com a palavra: embora sabendo quem a escreve que, no essencial, as coisas já foram ditas, o que se deseja é poder dizê-las de outras formas.» (entrevista de Pedro Teixeira Neves, "Este país maltrata a cultura, sempre a maltratou", de 14.02.2010).

Quando a A Génese do Amor, salta à vista o diálogo com autores canônicos de poesia amorosa, tanto universal (Petrarca, Dante), como portuguesa (Camões). No entanto, já que o livro não trata somente do amor, mas também da poesia, aparecem também referências, só que mais subtis, não tão directas, ao grande poeta e teórico de poesia, Fernando Pessoa (por ex. nos versos: «como depois de nós, / muito depois, / alguém, que será muitos, / falará»; em A Génese do Amor, Porto 2005, Campo das Letras, p. 20).
«(...) eu servi-me de Petrarca, de Dante, de Camões, sobretudo, do que edifica a nossa tradição lírica, para poder falar sobre o amor. Não quis, com isso, glosar Camões, mas prestar homenagem à tradição, ao mesmo tempo que subvertê-la.» (Ana Luísa Amaral em entrevista com Na Marques Gastão publicada em Diário de Notícias a 14.08.2005).

2 comentários:

  1. È interessante o facto de que A.L Amaral não incluiu no seu livro de poemas a Florbela Espanca uma poetisa de amor muito importante na literatura portuguesa. Talvez a poetisa quis sublinhar ainda mais o nascimento de uma voz feminina apresentando só o ponto de vista masculino?

    Seria interessante procurar se e de qual modo A.L.Amaral diz em outras palavras aquilo que disseram outras poetias.

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