domingo, 24 de outubro de 2010

A-Be-Ce-dário...

Pensaram uma vez porque os capítulos n'Os Cus de Judas não têm números, como é de costume, mas são enumerados pelas letras de alfabeto?

Segundo Ricardo Turnes: «Os capítulos são as letras do alfabeto, e o fio condutor leva-nos por todos os recantos da recordação: eis aqui a vergonha na sua totalidade, contada em todas as letras, para que não haja dúvidas, para que nada fique esquecido.» Será isso ou foi outra a intenção do autor? Tanto mais que a construção, ou melhor, o número dos capítulos no livro parece pensado de tal modo que aborde todo o analfabeto, de A a Z. Ou, talvez, não houvesse nenhuma intenção mas um simples capricho? ;)

O texto inteiro do comentário de Ricardo Turnes encontra-se aqui: http://alawebpage.blogspot.com/2007/08/ricardo-turnes-os-cus-de-judas.html

3 comentários:

  1. A Maria Alzira Seixo nos "Romances de António Lobo Antunes" também comenta essa opção peculiar de ordenar os capítulos. Diz assim "os vinte e três capítulos sucedem-se de acordo com as designações das letra do abecedário, no que poderá ser, de certo ponto de vista, um exame crítico e emocional da guerra em Angola de A a Z" (pag. 42). Esta escolha não me parece nada um capricho e a duas interpretações aqui citadas parecem iluminar bem o que me parece ter sido uma opção pensada pelo autor. Mas é verdade que poderá haver algo mais ligado a esta forma de ordenação do que esta ideia de totalidade, até porque a narrativa, as descrições, o pensamento, a linguagem são tudo menos lineares, não é? Achas que teria feito mais sentido nomear os capítulos "B,P,A,X,Z,C, ..."?

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  2. É verdade que a narrativa, as descrições, o pensamento e a linguagem não são nada lineares. Mas a descontinuidade, a fragmentação do discurso são os traços característicos para escrita classificada como pós-moderna.
    Seria uma experiência muito interessante reler o livro numa outra ordem dos capítulos, por exemplo essa que você propôs: "B,P,A,X,Z,C, ...". Seria um exercício semelhante àquele que Julio Cortazár, sendo o autor, propõe por exemplo no seu livro "Rayuela". Curioso até que ponto isso mudaria o sentido de "Os Cus de Judas"...

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  3. Acho que este modo de nomear os capítulos num certo modo faz referencia a mudança de rapaz em homem, as crianças aprendem alfabeto, os homens já o sabem e podem ir mais adiante, formar palavra, frases e discursos. E de novo a aprendizagem de alfabeto de novo serve como uma terapia e um passo para poder continuar a viver como um homem pleno, não quebrado pela guerra.

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